Sentença judicial confronta humor tóxico e preconceituoso de Leo Lins. Já era tempo
Até quando permitiremos que ela seja disfarçada de piada? No Brasil, onde minorias lutam por sobrevivência, a empatia deve prevalecer. Sempre.
Em 3 de junho de 2025, o humorista Léo Lins foi condenado a oito anos e três meses de prisão em regime fechado pela 3ª Vara Criminal Federal de São Paulo. Ele proferiu discursos preconceituosos contra minorias em seu show “Perturbador”, de 2022, no YouTube.
A sentença impõe multa de R$ 1,4 milhão e indenização de R$ 303,6 mil por danos morais coletivos. O caso reacende o debate sobre os limites do humor e da liberdade de expressão. Isso ocorre em um contexto de redes sociais sem regulamentação eficaz.
Lins cometeu crimes, e a decisão reforça que piadas não podem ser pretexto para incentivar o ódio. Esse ódio alimenta a violência física e psicológica contra grupos historicamente vulneráveis, um problema grave no Brasil atual.
Um show de intolerâncias
O caso começou com uma denúncia do Ministério Público Federal (MPF). O órgão apontou que Lins fez piadas ofensivas contra negros, pessoas LGBTQIA+, indígenas, nordestinos, judeus, evangélicos, idosos, obesos, pessoas com deficiência e soropositivos.
O vídeo alcançou mais de três milhões de visualizações antes de ser retirado em 2023. A juíza Barbara de Lima Iseppi considerou o show um “show de intolerâncias” que estimula violência verbal e intolerância.
A sentença destaca que Lins itiu o caráter preconceituoso de suas falas, demonstrando dolo e descaso com as vítimas. A liberdade de expressão, diz a juíza, não é permissão para discurso discriminatório.
A situação no Brasil é gravíssima, com dados que revelam desigualdades e violências. Pessoas trans vivem, em média, apenas 35 anos, reflexo da transfobia estrutural que permeia a sociedade.
Todos os dias, há 124 denúncias de pedofilia, a maioria em casa. Esse número, ironizado por Lins, é provavelmente subnotificado, escondendo uma realidade ainda mais sombria.
Uma pessoa negra tem quase três vezes mais chances de ser assassinada do que uma branca. Em 2024, quatro mulheres foram mortas por dia, vítimas de feminicídio.
Esses números não são apenas estatísticas. São vidas destruídas por uma cultura de intolerância que discursos como os de Lins ajudam a perpetuar.
Reações polarizadas e consequências globais
A condenação gerou reações polarizadas. O jornal O Estado de S. Paulo defendeu Lins, dizendo que “não se pode punir quem faz piada”. Essa visão ignora o impacto de discursos que normalizam a discriminação.
Piadas que reforçam estereótipos não são inofensivas. Elas alimentam um ciclo de violência, tanto psicológica quanto física, contra grupos vulneráveis. Fábio Porchat e Antônio Tabet criticaram a sentença, alegando censura à arte cômica. Já Bruna Braga defendeu a punição, destacando que racismo não é humor.
Juristas, como Welington Arruda, reforçam que a Constituição veda discursos de ódio. Isso vale mesmo em contexto artístico, quando promovem exclusão e humilhação.
A sentença enfatiza que a liberdade de expressão não é absoluta. O humor não pode ser “e-livre” para crimes de ódio, diz a juíza. O agravante da pena considerou a ampla divulgação na internet. O contexto de “descontração” mascara a gravidade das ofensas, segundo a decisão.
A sentença alinha-se à Lei 7.716/89, que criminaliza a discriminação racial, e ao Estatuto da Pessoa com Deficiência. Ela protege os direitos humanos.
No Brasil, onde a violência contra minorias é endêmica, essa sentença lembra que palavras têm peso. Elas geram consequências reais e duradouras.
Casos semelhantes ocorreram em outros países. Nos EUA, em 2023, Dave Chappelle enfrentou ação civil por piadas transfóbicas em “The Closer” na Netflix.
Grupos LGBTQIA+ conseguiram indenização de US$ 2 milhões. O tribunal de Nova York considerou que as falas incitavam discriminação e violência.
Na França, Dieudonné M’bala M’bala foi condenado em 2022 a dois anos de prisão. Suas piadas antissemitas promoviam ódio racial e negacionismo.
No Reino Unido, Count Dankula foi multado em £800 em 2018. Ele ensinou seu cão a fazer saudações nazistas, considerado “grosseiramente ofensivo”.
Esses casos mostram que, globalmente, o humor não isenta a propagação de preconceitos. A justiça está mais atenta a discursos de ódio.
Um chamado à empatia
Nós, homens hétero, brancos e cisgênero — cuja identidade de gênero corresponde ao sexo atribuído ao nascer —, jamais sentiremos essas dores. Não vivemos o medo constante ou a desumanização por piadas.
Podemos e devemos exercer empatia. Isso falta em Lins e em defensores como o Estadão, que ignoram as dores alheias.Quero deixar claro que não sou contra humoristas, comediantes, artistas de rua, muito pelo contrário. Respeito profundamente os palhaços, malabaristas e performers que exercem sua arte com dignidade. Mas uma metáfora me veio à mente: Léo Lins é um palhaço de rua, atirando balões de piadas que estouram com um gás de extremo mau odor, como bombas de efeito moral, cheias de veneno preconceituoso.
Ele ri, achando que só intoxica os “outros”, mas o fedor gruda nele e em todos nós. Ridicularizar um humano é pisar no tapete que compartilhamos. Uma civilização decente joga fora esses balões, porque ninguém é dessemelhante, e rir do outro é só exibir a própria cara de bobo.
A condenação de Lins é um chamamento para percebermos o quão doente está nossa sociedade. Ela ri ao humilhar quem não segue a manada. Pessoas que lutam para ser quem são tornam-se vítimas. São desumanizadas por quem as torna dessemelhantes, negando sua dignidade.
Em redes sociais ainda sem regulação, ataques a minorias são travestidos de “liberdade de expressão”. A condenação de Lins é um precedente importante. O Judiciário está atento ao impacto de discursos discriminatórios, especialmente os amplificados digitalmente.
A defesa de Lins, porém, anunciou recurso. Eles argumentam que as piadas não incitavam preconceito, apenas divertiam. Essa narrativa não apaga o dano nem a responsabilidade.
A sociedade brasileira deve equilibrar liberdade criativa e responsabilidade. Não se pode oprimir em nome do entretenimento.
Casos como este reforçam a necessidade de combater o extremismo. Devemos proteger a dignidade humana com um humor que una.
A decisão, ainda ível de revisão, é um o contra a banalização do ódio. É um convite à reflexão sobre a violência verbal.
Até quando permitiremos que ela seja disfarçada de piada? No Brasil, onde minorias lutam por sobrevivência, a empatia deve prevalecer. Sempre.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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