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Sara York

Sara Wagner York ou Sara Wagner Pimenta Gonçalves Júnior é bacharel em Jornalismo, licenciada em Letras Inglês, Pedagogia e Letras vernáculas. Especialista em educação, gênero e sexualidade, primeiro trabalho acadêmico sobre as cotas trans realizado no mestrado e doutoranda em Educação (UERJ) com bolsa CAPES, além de pai, avó. Reconhecida como a primeira trans a ancorar no jornalismo brasileiro pela TVBrasil247.

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Futurofobia: como os jovens brasileiros enxergam o futuro (II)

Violência estrutural e medo do amanhã: o que os dados nos contam

Jovens olham anúncios de vagas de emprego no centro de São Paulo (Foto: Reuters/Amanda Perobelli)

Na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), perguntei a um grupo de estudantes de graduação: "Como vocês enxergam o futuro?" O silêncio e logo depois, vieram palavras como "incerteza", "medo", "ansiedade", "luta" - mas também "sonho", "transformação", "resistência". Essa dicotomia entre o pavor e o desejo de mudança ecoa com força nos dados do Relatório de Futuros 2025, desenvolvido em parceria com o movimento Teach the Future Brasil, que nos oferece um retrato urgente e necessário sobre como a juventude brasileira percebe o amanhã. (Segunda parte)

2.⁠ ⁠FUTUROFOBIA: Violência estrutural e medo do amanhã: o que os dados nos contam

A juventude não tem medo à toa. O medo é concreto, encarnado nas estatísticas de uma sociedade que naturaliza a exclusão e a violência. O Atlas da Violência 2025 revela que 75% das vítimas de homicídio são negras, e que os homicídios de jovens negros cresceram 11% entre 2019 e 2021, enquanto os de jovens brancos caíram.

A população LGBTQIA+ também enfrenta uma escalada brutal de ataques: de 2014 a 2023, houve um aumento de 1.227% nos registros de violência contra pessoas LGBTI no Brasil. Só em 2017, 445 pessoas LGBTQIA+ foram assassinadas, um crescimento de 30% em relação ao ano anterior. Vivemos, assim, não apenas uma crise de futuro, mas uma crise de presente - onde o direito de existir, de envelhecer e de sonhar é negado a muitos.

Nesse cenário, cabe perguntar: o que acontece quando um corpo dissonante entra em um espaço que se acostumou com o conforto da semelhança? Em uma sala de aula onde todos são brancos, ricos, úteis e gozam de grande prestígio, o que representa a chegada de um Nego Bispo? Mais que um corpo negro em movimento, Nego Bispo é ideia, é contradição, é abalo. É o enegrecimento do mundo e a exigência de que o conhecimento deixe de ser uma linha reta e e a ser um rizoma de vivências. Ele tensiona, com sua presença e pensamento, as bases sobre as quais a escola foi construída: a universalidade branca, a meritocracia, a epistemologia da escassez.

A entrada da diferença nesses espaços não é decorativa, não é para "diversificar o cardápio". É um desafio político e ético: como sustentar uma pedagogia que conviva com saberes não hegemônicos? Como reconfigurar o currículo quando a ancestralidade de matriz africana ou a sabedoria dos corpos trans e travestis são convocadas a falar de igual para igual com Aristóteles, Foucault ou Piaget?

A escola, quando verdadeiramente comprometida com a justiça, precisa deixar de ser um palco para a repetição e tornar-se um campo de escuta radical. A presença de corpos dissidentes - negros, indígenas, periféricos, LGBTQIA+, PcDs - desestabiliza o conforto das certezas e convida ao aprendizado real: aquele que dói, que reposiciona, que exige reconfiguração do eu.

É por isso que pensar em políticas educacionais sem considerar quem são os corpos que estão (e os que não estão) na sala de aula é perpetuar uma farsa. O medo do amanhã que habita muitos jovens é alimentado por um presente que os rechaça, que os considera descartáveis, que não os nomeia, não os reconhece e, muitas vezes, não os vê. Contra isso, a pedagogia da diferença não é uma concessão progressista: é condição mínima de justiça.

Em tempos de ENEM, vestibulares e disputas por lugares cada vez mais escassos, é essencial lembrar que nem todo mundo parte da mesma linha. E que há quem precise atravessar muros invisíveis, violências explícitas e silenciamentos seculares para chegar até a porta da escola. Se a educação pública quer ser instrumento de transformação e não de reprodução da desigualdade, ela precisa acolher essas presenças como centrais. Não como exceção exótica, mas como bússola ética para novos futuros possíveis.

A diferença, quando entra na sala, não é problema: é potência. E talvez o maior desafio da escola não seja ensinar matemática, português ou ciências, mas preparar corações e mentes para que saibam conviver com aquilo que não são - e, a partir daí, construir um mundo onde ninguém precise ter medo de existir.

Amanhã tem mais!

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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